segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Em crise, magistério atrai cada vez menos


Com a professora de História doente, e sem que a escola conseguisse substituto, o jeito foi os alunos fazerem as vezes de professor: em julho de 2009, três alunos do 3º ano do ensino médio da Escola Estadual Ernesto Faria deram aula dessa disciplina para colegas que estavam no 1º e no 2º ano.

A falta de professores que atinge os ensinos fundamental e médio é um problema que começa nos bancos das universidades, onde os alunos não querem mais se formar como professor.

Um levantamento dos últimos censos escolares do Inep mostra que, de 2005 a 2008, caiu 12,4% o número de concluintes de cursos superiores de "formação de professores de matérias específicas" - o item, no censo escolar, que abriga licenciaturas como as de Português, Matemática, Química e Física.

Se eram 77.749 em 2005, foram para 68.128 em 2008 - ano que viu 817 alunos concluírem cursos de "formação de professores em Português", enquanto o de Direito formou 85 mil, e cursos de Administração, 103 mil.

O dado vai ao encontro de números da Fundação Carlos Chagas que dão conta de que, em média, 70% dos alunos que entram em cursos de licenciatura desistem antes de completá-lo.

Diminuiu ainda o número dos que entram nas faculdades para cursá-los: de 2005 a 2009, o número de alunos ingressando nesses cursos caiu 23,7% na rede privada e de 11,4% na rede pública, segundo o Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp). Nesse período, o número total de matrículas em cursos de licenciatura nas redes pública e privada também caiu 8,1%.

- Já seria preocupante se esse número não tivesse crescido, mas caiu. E isso porque temos déficit de professores, não excesso - sublinha Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp.

O déficit de professores, apenas da 5ª série do fundamental ao 3º ano do ensino médio, é de 246 mil no país. O quadro é mais crítico em Física, Química, Matemática e Biologia.

Para os professores que permanecem na carreira, fica a sobrecarga. Segundo dados do Inep, do Ministério da Educação, 753,8 mil professores no país na educação básica (redes pública e privada) davam aula para cinco ou mais turmas em 2009. No ensino médio, 72.241 lecionam para dez ou mais turmas.

Uma professora para 12 turmas

Professora de História, Wânia Balassiano, de 45 anos e há 25 na rede estadual, tem 12 turmas na Escola Estadual Ernesto Faria, outras cinco numa escola particular e ainda dá aulas em casa:

- Fico sobrecarregada, já adoeci e sei que a qualidade da aula seria melhor com menos turmas. A carreira não é valorizada, o estado não incentiva que a gente faça mestrado, os salários são baixos. Amo o que faço, mas a sensação é que escolhem o magistério porque não têm coisa melhor para fazer.

Ou porque não acham algo melhor. Estudo da Fundação Carlos Chagas em 2009 mostra que 68% dos alunos que cursam licenciatura vêm de escolas públicas.

- A maioria não conseguiu passar para outra carreira. E os melhores não vão para a sala de aula, preferem fazer mestrado - diz Mozart Ramos, do movimento Todos pela Educação.

- Minha turma começou com 20 alunos. Hoje somos cinco - conta Rodrigo Barreto, no 3º período da licenciatura de Letras da Uerj.

Em outro setor da universidade (Física), João Pedro Brasil, de 20 anos, faz licenciatura, mas também bacharelado, como outros cinco colegas. Fazendo apenas licenciatura, só conhecem na turma Sofia de Castro, de 19:

- Já fui monitora de colégio e vi que dar aula era o que queria - diz ela. Perguntada sobre quanto imagina ganhar, responde: - É melhor não pensar.

Entrave maior para a valorização da carreira, o salário tem piso nacional que não chega a R$ 1.100 para 40 horas semanais. Mas esse valor não está sendo aplicado por muitos governos porque a lei está sob análise do Supremo Tribunal Federal, após estados entrarem com pedido de revisão do texto.

- Não adianta falar em salário ideal quando a gente não consegue implementar nem o mínimo - observa Paulo Corbucci, pesquisador de educação do Ipea.

Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, Roberto Leão defende que os problemas não sejam atacados de forma isolada:

- Professor precisa de plano de carreira, escolas com estrutura e a chance de se atualizar.

Secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda admite que "houve desinteresse muito grande pela carreira", mas aponta ação para valorizá-la:

- A criação de um piso nacional, que trouxe também tempo mínimo obrigatório para o professor se dedicar à reciclagem.

Pilar diz ainda que o MEC prevê 300 mil vagas para a Plataforma Freire, um programa para professores que já estavam dando aula mas não tinham formação adequada. Até agora, há cem mil - um terço - inscritos. (Alessandra Duarte e Carolina Benevides)

Fonte: O Globo

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