segunda-feira, 30 de maio de 2011

Anistia na Amazônia vai representar mais desmatamento

Para pesquisador do Inpa, todas as mudanças propostas na nova lei 
abrem espaço para aumentar o desmatamento na Amazônia, mas de alguma forma impõem limites.

Se a anistia aos desmatadores não for retirada do texto que altera o Código Florestal Brasileiro, a destruição da Amazônia pode perder o controle. A opinião é do ecólogo Philip Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). A Câmara dos Deputados brasileira aprovou na terça, dia 24, um proposta de lei que altera as regras de proteção florestal em todo país, tornando-a mais permissiva e também perdoando crimes de desmatamento realizados até 2008.

Segundo Fernside, todas as mudanças propostas pelo relator da proposta de lei, o deputado do Partido Comunista do Brasil ,Aldo Rebelo, abrem espaço para aumentar o desmatamento na Amazônia, mas de alguma forma impõem limites. "A anistia não, porque abre a porta para o desmatamento até a última árvore", lamenta. "Vão continuar o corte na esperança de ser anistiado e isto não vai ter fim. Vão esperar outra reforma no Código ou outra anistia", completa.

Fearnside faz estudos sobre impactos de grandes projetos na Amazônia desde a década de 70 e já foi apontado como o segundo cientista mais citado no mundo quando o assunto é a região. Para ele, as mudanças afetam a imagem do Brasil no Exterior porque compromete metas voluntárias assumidas pelo país durante negociações internacionais. O Brasil pretende reduzir as emissões de carbono em até 38,9% até 2020. Mas o compromisso está seriamente ameaçado: o avanço do desmatamento em 27% na Amazônia este ano é apontado como decorrência da expectativa de que aprovação do Código Florestal vá perdoar os infratores.

O cientista lembra que além da anistia, a proposta aprovada no Congresso altera a forma como são medidas as matas que protegem os rios da Amazônia. Ele cita o estudo da Academia Brasileira de Ciências que aponta que em função da simples mudança na base de medição, a proteção das bordas de rios na Amazônia pode ser reduzida em 60%. Fearnside destaca a importância da mata ciliar, importantes corredores de migração de animais e plantas e que viabilizam a biodiversidade em mosaicos fragmentados. E claro servem para evitar inundações.

O Código aprovado isenta proprietários de até 4 módulos rurais (uma medida que varia muito no país) de manter a Reserva Legal. A Reserva Legal é um dispositivo no Código Florestal Brasileiro que obriga aos proprietários a manter uma parcela de sua propriedade com cobertura vegetal nativa. Na Amazônia, essa reserva deve ser de 80% da propriedade. O argumento do deputado Aldo Rebelo é que tal dispositivo da lei impede o sucesso de pequenos produtores na Amazônia

A Academia Brasileira de Ciências defende uma legislação diferenciada para a agricultura familiar, mas utilizar o módulo rural como forma de distinção é arriscado. Em alguns lugares da Amazônia o módulo rural equivale a 100 hectares. Além disso, há o temor de que grandes propriedades sejam fracionadas para se encaixarem nesta brecha. O que não é difícil. Em Apui, sul do Amazonas, por exemplo, um estudo do Inpa apontou que uma mesma família é dona de 38 lotes, cada um com 100 hectares.

A bióloga Rita Mesquita, também do Inpa, lamenta que os deputados federais não tenham se baseado em argumentos técnicos e científicos durante as discussões do Código. "Você sabe que 61 milhões de hectares desmatados e degradados no país podem se tornar produtivas, inclusive para o agronegócio", pergunta a pesquisadora. "Agora nós vamos ceder nossa biodiversidade, nossos recursos naturais, para multinacionais se implantarem em nosso país em troca de terra barata e trabalho escravo."

Ela considera que houve uma inversão nas discussões, sobre o que seria realmente positivo para o Brasil e o que atenderia interesses estrangeiros. "A sociedade brasileira está sendo enganada quando dizem que a preservação é internacional, como se o agronegócio não estivesse nas mãos de empresas internacionais. Eu diria que o agronegócio é internacional e a conservação do Brasil", completa.

Em nota divulgada nesta quinta-feira, 26 de maio, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) propõem ao governo federal um prazo de dois anos para construção de um novo Código Florestal. As duas instituições classificam de precipitada a decisão tomada pelos deputados federais, por não terem levado em conta aspectos científicos e tecnológicos na aprovação da proposta de lei.

O comunicado, que considera a necessidade de uma revisão da lei de 1965, afirma que o Parlamento nunca convidou formalmente a ABC ou a SBPC para as discussões sobre o substitutivo aprovado. Afirma também que duas cartas haviam sido enviadas a congressistas e presidenciável alertando sobre a a necessidade de um prazo maior para discussões aprofundadas sobre o Código Florestal.

As duas instituições ressaltam ainda estarem à disposição do Senado para a discussão do novo código. A nota deixa claro também que às críticas ao Código não tem vinculação com movimentos ambientalistas ou ruralistas, mas são feitas em nome da sustentabilidade do país. ABC e SBPC criaram em julho do ano passado um Grupo de Trabalho para discutir mudanças na lei ambiental. As propostas foram transformadas em um livro, lançado em marco deste ano.

A carta reconhece a contribuição do agronegócio para a produção de alimentos e na balança comercial brasileira, mas ressalta que a ampliação do agronegócio deve ocorrer sem prejuízos a preservação e conservação dos recursos ambientais do País.

Fonte: Revista O Eco Amazônia

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