Estudo feito com voluntários que jogavam game e com vestibulandos mostra novo elo entre sonhos e memóriaColocando voluntários para jogar Doom, game que ganhou fama nos anos 1990, a equipe do neurocientista Sidarta Ribeiro descobriu que, para aprender alguma coisa, não bastar dormir bem: é preciso sonhar. Mas não demais.Matar monstros (missão do jogador do game) pela ciência não é só diversão: os voluntários têm sua atividade cerebral monitorada quando vão dormir. Os cientistas acordam os jogadores que sonham e fazem com que descrevam os seus sonhos.Cruzando essas respostas com a evolução no desempenho dos voluntários no jogo, descobriram que, para aprender a jogar, sonhar realmente é importante. Os voluntários que não sonhavam com o jogo tinham mais dificuldade para, no dia seguinte, matar monstros e passar por fases.Quando alguém sonha, é como se o cérebro estivesse salvando as informações importantes do dia em um arquivo permanente."O Doom envolve a memória que você tem consciência de ter, como saber onde fica uma passagem secreta ou onde você pega uma arma, e também outro tipo de memória, como a melhora na pontaria conforme você joga", diz Ribeiro, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e do Instituto Internacional de Neurociência de Natal.A equipe imaginava que os voluntários que se envolviam muito com o jogo, sonhando muito com ele, virariam campeões. Não foi o que aconteceu. A partir de certo ponto, quanto mais você sonha, menos você aprende.Acharam uma possível explicação: sonhos demais talvez levem a estresse, algo que atrapalha o desempenho. A pessoa não está aprendendo com eles -os sonhos são, aí, só uma demonstração do impacto causado pelo tema no sujeito."O Doom mobiliza o sujeito emocionalmente. Ele fica com medo dos bichos, com muita raiva deles", diz Ribeiro. São conhecidos casos extremos de pacientes que sonham exageradamente com um mesmo tema -como alguns veteranos de guerra-, e eles provavelmente não estão tendo nenhum aprendizado com isso.Os cientistas queriam, entretanto, trocar o Doom por um desafio mais real. Investigaram mais de 60 vestibulandos da UFRN, que relatavam se tinham sonhado com a prova no dia anterior a ela.Era maior a chance de ser aprovado se a pessoa tinha sonhado apenas medianamente com a prova (nem muito, nem pouco) e se o sonho não envolvia grandes emoções e estresses -como conteúdos de geometria ou encontrar amigos fazendo a prova, por exemplo.Quem não tinha sonhado ou quem tinha sonhado com coisas negativas -"pesadelos como encontrar o portão fechado, esquecer a caneta ou se ver nu na prova", nas palavras de Ribeiro- teve notas piores no teste. Ao que parece, portanto, embora não seja possível controlar os sonhos, um ambiente desperto menos estressante favorece os sonhos "do bem".Experiência própriaO neurocientista Sidarta Ribeiro diz que uma experiência pessoal o fez se interessar pela relação entre sono e aprendizado."Quando fui fazer doutorado nos EUA, achava que sabia biologia molecular e inglês. Descobri que não sabia nenhum dos dois. Resolvi trabalhar feito louco para compensar, mas passei a sentir um sono imenso: dormia 16 horas por dia. Achava que meu corpo estava me sabotando", contou Ribeiro.Só após refletir um pouco, diz, percebeu que era o oposto. "Se você aprende muito, conhece coisas novas, sente mais sono."Num experimento com crianças numa escola, permitia que cochilassem um pouco entre as aulas. "Esse sistema de aula e sono, aula e sono funciona. Deveria ser usado até na pós-graduação", brinca.Fonte: (Ricardo Mioto) Folha de SP
quarta-feira, 28 de julho de 2010
Sonhar demais atrapalha aprendizado, diz neurocientista
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