terça-feira, 19 de outubro de 2010

Qualidade de ensino evolui mais no ciclo fundamental



Mais de 3,5 mil cidades já superam meta fixada pelo Ideb


O mais importante indicador educacional do país mostra que a qualidade da educação nos últimos anos avança mais rapidamente no ciclo fundamental e apresenta melhora limitada no ensino médio. Mais de 3,5 mil cidades brasileiras superam - com folga em muitos casos - a atual meta (nota 4) do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) nos anos iniciais da vida escolar.

Esses municípios apostaram em uma combinação de políticas públicas que inclui reforma e construção de escolas, renovação maciça de material pedagógico e compra de equipamentos, elaboração de planos municipais, planejamento e monitoramento, incentivo à formação e atualização de professores, atenção ao transporte de alunos, aumentos salariais e adoção do modelo de educação em tempo integral.

Embora longe da gestão, o Ministério da Educação (MEC) aumentou o controle sobre o ensino básico, ampliando os convênios e programas dirigidos aos municípios e também elevando os repasses de recursos, muitas vezes feitos diretamente na conta corrente da escola.

"Nos últimos anos, o MEC começou a intensificar iniciativas de articulação com os municípios, com dinheiro e apoio técnico. Isso acontece menos com os governos estaduais, porque a relação política tende a ser mais tensa. O contato com as prefeituras é diferente, elas precisam mais do MEC", analisa Ocimar Munhoz Alavarse, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).

A nota média do Ideb das escolas públicas do primeiro ciclo do ensino fundamental, de competência das prefeituras, subiu de 3,6, em 2005, para 4,4 no ano passado. Na esfera estadual, a nota do nível médio variou num ritmo bem menos intenso no período, de 3,1 para 3,4, pouco acima da meta de 3,2.

O Ideb é calculado a cada dois anos, a partir do cruzamento de dados de aprovação e evasão com avaliações de proficiência em português e matemática. A partir das notas de cada biênio, o governo traça metas para os dois anos seguintes. O objetivo é chegar em 2021 com Ideb de 6 - patamar educacional da média dos países da OCDE.

Maria do Pilar Lacerda, secretária de Educação Básica do MEC, reconhece que, atualmente, a organização e o currículo do ensino médio estão defasados. "Costumo dizer que são alunos de uma geração digital para uma escola analógica. Os que estão no ensino médio hoje entraram numa escola completamente diferente há dez anos e sabemos que leva tempo para os indicadores começarem a mostrar melhoria, que chega primeiro nos anos iniciais e vai chegando como onda nos ciclos finais", explica.

Citando o Enem e o programa Ensino Médio Inovador (EMI), Maria do Pilar ressaltou que o MEC mantém políticas concretas para o último ciclo da educação básica. "Repassamos R$ 100 milhões por meio do EMI para as secretarias estaduais reforçarem suas ações, aumentando em 20% a carga horária das aulas, criando disciplinas optativas e atividades extracurriculares, com ênfase na leitura, e incentivando a dedicação exclusiva dos professores."

O programa tem hoje adesão de 350 escolas e deve ser ampliado em 2011. O professor Avalarse diz que os maiores desafios do ensino médio estão no atendimento. "O país consegue matricular bastante no primeiro ano, mas perde muita gente no decorrer do ciclo. O Ideb não vai melhorar, se a evasão continuar."

Tida como uma arma para melhorar a educação pública, o ensino integral já é realidade em 377 municípios brasileiros, entre eles Santos, no litoral de São Paulo, Cuiabá (MT) e Teresina (PI). Todos recebem recursos do programa federal Mais Educação e se destacaram no Ideb. "[O ensino integral] É uma tendência mundial, uma resposta para os problemas concretos da educação", diz Terezinha do Nascimento, diretora da Escola Municipal Padre Waldemar Martins, em Santos.

Aberta no ano passado, a escola recebe 290 alunos de 1ª à 5ª série, das 7h30 às 17h30. Fora do horário regular de aulas, as crianças têm cinco refeições diárias e participam de oficinas de línguas e artes, fazem atividades físicas na quadra e na piscina, cuidam de uma pequena horta comunitária e têm tempo para brincar no pátio e no playground.

"Gosto mais daqui do que da outra escola que estudava, fico triste porque não venho no fim de semana", conta João Felipe, de oito anos, na 3ª série. Sua professora, Renata Benetti Cunha destaca a convivência. "A oportunidade de aprendizagem é maior, porque a estrutura permite e o convívio é muito melhor, trabalhamos mais o senso de cooperação", diz.

Com 20 anos de experiência na rede pública tradicional, a diretora se surpreendeu com o rendimento dos alunos. "Nosso Ideb só sai em 2011, porque a escola é nova, mas as avaliações internas estão ótimas", complementa Terezinha. No total, Santos conta com seis novas escolas de ensino integral. As outras 36 escolas regulares da rede municipal, por falta de recursos e estrutura adequada, foram convertidas ao modelo graças a parcerias com clubes, igrejas e associações de bairro. Os alunos dessas unidades também têm atividades paralelas fora do horário de aulas em 22 núcleos espalhados pela cidade.

Sueli Maia, secretária municipal da Educação, está convencida que a maior permanência do aluno na escola é uma das respostas para o avanço acima da média do Ideb dos anos iniciais do ensino fundamental da rede municipal de Santos, que subiu de 4,4 para 5,3 entre 2005 e 2009.

"Dados mostram que aulas de teatro ou a prática do xadrez contribuem para melhorar o desempenho em português e matemática", exemplifica. Ela cita outras políticas implementadas pela prefeitura, que ajudam a melhorar o ensino, como a abertura das escolas nos fins de semana, o pagamento acima do piso nacional e a oferta de bolsas de estudo para professores.

A melhora da educação pública de Teresina também chama atenção. A nota do Ideb para o ciclo final do ensino fundamental cresceu de 3,9, em 2005, para 4,7 no ano passado, ficando bem acima da meta do MEC (4,1). O secretário da Educação da capital do Piauí, José Ribamar Torres, conta que o desempenho é consequência de pelo menos 20 anos de trabalho focado no planejamento e monitoramento da atividade pedagógica da rede.

"Equipes da secretaria visitam as escolas diariamente e avaliam e discutem a performance dos professores na sala de aula. A partir daí definimos estratégias específicas de capacitação", conta Torres. Os professores com defasagem frequentam semanalmente um centro de treinamento, onde participam do Horário Pedagógico. "São oficinas focadas nos problemas identificados em sala de aula", relata o secretário, que comanda uma rede com 147 escolas, 85 mil alunos e 2,5 mil professores.

Em Cuiabá, no Mato Grosso, além da adoção progressiva da escola em tempo integral, o avanço do Ideb é atribuído a políticas de gestão e à formação dos professores. "Aprovamos nosso plano municipal de educação (PME) em 2007, desde então percebemos que as coisas estão andando, embora haja muito a ser feito", assinala Permínio Pinto Filho, secretário municipal da Educação.

O PME da capital mato-grossense, diz ele, está centrado em três pilares: gestão, currículo e formação. "Cada escola tem um plano de gestão, que trata da questão da infraestrutura aos problemas sociais dos alunos e suas famílias. Os currículos são atualizados anualmente e não temos professores sem diploma de curso superior desde 2005, incluindo a zona rural", conta o secretário.

Em Parintins, segunda maior cidade do Amazonas, as iniciativas que ajudaram a melhorar o Ideb são estruturais, explica Maildson Fonseca, titular da Secretaria Municipal da Educação. "Fizemos os investimentos corretos, nos últimos três anos. Foram construídas 4 escolas na zona urbana e 16 na zona rural, e a maioria das 143 unidades educacionais foram reformadas e ampliadas. Também melhoramos o sistema de transporte da grande maioria dos alunos, que vai de barco para a escola." Segundo Fonseca, a maioria desses investimentos é custeada por convênios firmados com os governos federal e estadual.

Repasses do MEC ao ensino básico cresceram 180% em 5 anos

A evolução da qualidade da educação brasileira, principalmente nas pequenas cidades, depende cada vez mais do dinheiro do Ministério da Educação (MEC). Em cinco anos, os repasses dos três principais programas de apoio ao ensino básico aumentaram mais de 180% em termos nominais.

Neste ano, os recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), que injeta verbas na conta corrente da unidade escolar para melhorias de infraestrutura e gestão, do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (Pnate) somam R$ 5 bilhões.

Em 2005, Estados e municípios receberam cerca de R$ 1,8 bilhão. Considerando outros seis programas importantes, entre os mais de 20 gerenciados pelo MEC, os recursos federais repassados a governos estaduais e prefeituras em 2010 superam a marca de R$ 15 bilhões.

"Não se trata de uma relação de dependência, é o nosso papel. Está na Constituição: a União tem obrigação de complementar e colaborar técnica e financeiramente com Estados e municípios", afirma a secretária de educação básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda.

O secretário de Educação de Teresina, José Ribamar Torres, disse ao Valor que os recursos federais respondem por quase 80% do orçamento total da pasta, que chegou a cerca de R$ 240 milhões neste ano. "É dinheiro para pagamento de salários, reformas, merenda. A capital do Piauí tem arrecadação baixa, logo os recursos federais são decisivos para fazer qualquer política de educação."

Ele sugere que a política salarial da educação municipal seja federalizada. "O maior problema que enfrentamos é a rotatividade de professores. Muitos se licenciam, fazem outros concursos para ganhar mais e não temos autonomia para pagar bons salários e abrir contratações sempre que precisamos", afirmou Torres.

Em Cuiabá, no Mato Grosso, o secretário da Educação, Permínio Pinto Filho, diz que os repasses federais do MEC estão perto de R$ 90 milhões. "É uma parcela importante, entre 40% e 45% de tudo que investimos na capital."

Sueli Maia, secretária da Educação de Santos, cobra mais recursos federais para o setor. "O antigo Plano Nacional de Educação não conseguiu atingir suas metas por falta de investimento, não adianta traçar metas se não falar em maiores e novas fontes de investimentos. A União tem papel importante nisso, principalmente com a perspectiva das receitas que virão do pré-sal - 50% devem ser destinadas à educação."

Ela destaca o aumento do orçamento do MEC nos últimos anos. Os recursos administrados pela pasta triplicaram em termos correntes entre 2003 e 2010: de R$ 19 bilhões para R$ 60 bilhões.

Segundo Sueli, a ampliação dos investimentos federais já surte efeito na qualidade. Criado em 2007 para unidades educacionais com baixo desempenho no Ideb, o Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE-Escola) teve seus recursos incrementados de R$ 49,5 milhões para R$ 370,1 milhões em três anos. A secretária diz que "60,9% das escolas priorizadas pelo programa apresentaram resultados melhores no Ideb 2009 em relação à nota de 2007. Dessas, 40% apresentaram resultado igual ou maior à média nacional." (Luciano Máximo)

Fonte: Valor Econômico

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