segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Chips made in Brasília


 
Todos os eletrônicos que deixam a vida muito mais prática nos dias de hoje - do controle remoto até os poderosos computadores de um aeroporto, por exemplo - funcionam graças a pequenos circuitos integrados.
Peças de alguns milímetros quadrados que agrupam minúsculos transistores, eles são responsáveis pela coordenação das principais funções das máquinas.
Os chips têm valor inversamente proporcional ao seu tamanho - quanto menores, mais valiosos - e são a causa de um dos maiores problemas da balança comercial brasileira, que perde US$ 25 bilhões por ano com a importação dessas peças.
Para mudar esse quadro, é preciso fazer com que os chips sejam produzidos no Brasil, algo mais complicado do que parece.
A indústria de semicondutores exige investimento pesado em infraestrutura e capacitação.
Desde 2004, o governo federal tenta resolver o problema com a criação de design houses, casas de projetos financiadas através do programa CI Brasil, do Ministério da Ciência e Tecnologia.
A Universidade de Brasília (UnB) é sede de uma dessas casas, a DFChip, a primeira do Centro-Oeste. Dez pessoas trabalham na iniciativa desde julho passado, literalmente desenhando os circuitos integrados.
O trabalho é longo e delicado. Mesmo pequenos, os chips são responsáveis pela competitividade da indústria de eletrônicos, por isso recebem tanta atenção. Antigamente, os aparelhos funcionavam com grandes circuitos elétricos.
"Mas as empresas, por pressão do mercado, tiveram que melhorar seus produtos, aumentando a performance, diminuindo o tamanho e o consumo de energia. Para isso, desenvolveram os circuitos integrados", conta Mario Vergara, gerente técnico da DFChip.
Além disso, os próprios chips melhoraram muito com o passar do tempo. "No início dos anos 1970, havia enormes computadores com uma capacidade irrisória. Já existiam microchips dentro dessas máquinas, mas eram muitos e faziam pouca coisa", explicaWagner Araújo, engenheiro de aplicação da design house da UnB. "Nos dias de hoje, com menos elementos em uma placa, é preciso menos energia para fazer o computador funcionar. Isso deixou o PC muito mais rápido também", completa.
Assim, projetar bons circuitos integrados é uma forma de ganhar mercado. O engenheiro de aplicação da DFChip cita o exemplo do iPad, o eletrônico com maior adesão na história, fora os telefones. "A Apple criou um chip sofisticado para o tablet e deve ter gasto algo entre US$10 milhões eUS$20 milhões.
Agora, imagine o retorno que a companhia não está conseguindo com as vendas", exemplifica.
Essa balança, porém, só fica equilibrada se, na hora de fabricar o circuito integrado, o volume for grande o bastante para valer os custos da produção. Para tornar o processo viável, as indústrias precisam fazer, no mínimo, 100 mil unidades do chip, por um período de três a cinco anos. A regra vale para qualquer tipo de semicondutor, dos mais simples aos mais complexos.
Um microchip de computador pode custar US$ 100; já os que vão em etiquetas de identificação por radio-frequência (RFID) custam US$ 0,10 ou US$ 0,20. "Qualquer circuito precisa de um chip hoje. E a indústria depende da evolução constante da tecnologia", reforça Wagner Araújo.
Investimento
Por que, afinal, desenhar um chip é tão caro? "Formar um projetista não é barato. Não há cursos de graduação específicos para isso no Brasil. Quem quer seguir a área precisa fazer mestrado ou doutorado, que, muitas vezes, são focados na atuação acadêmica", comenta Mario Vergana. "E a indústria ainda é incipiente, não adianta criar um currículo universitário se a pessoa não vai ter onde aplicar esse conhecimento", completa Wagner.
A arquitetura do semicondutor também custa um dinheirão. Os softwares utilizados para gerar os códigos são proprietários e a licença não sai por menos de US$ 200 mil ao ano, podendo chegar a US$ 1 milhão. Por conta disso, mesmo grandes empresas costumam terceirizar o projeto de chips.
É aí que entra a valorização das design houses. Os editais do Ministério da Ciência e Tecnologia (foram dois até agora) dão um prazo de dois anos para que as casas de projetos se estabeleçam. A ideia é que, depois desse período, elas consigam se firmar como empresas para atender indústrias nacionais e estrangeiras.
A DFChip ainda não tem uma "cara" específica. "Cada design house tem liberdade para definir sua área de atuação. Em geral, isso depende da região onde a casa está inserida. Se o Distrito Federal for forte em telecomunicações, provavelmente vamos projetar chips para essa indústria", explica Higor Santana, gerente de desenvolvimento empresarial do Centro de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CDT) da UnB.
Além da DFChip, há outras 21 design houses espalhadas pelo país - 12 delas em órgãos públicos e a maioria nas regiões Sul e Sudeste.
Por enquanto, a casa de projetos de Brasília está atendendo apenas um cliente, uma empresa de São Paulo que trabalha em parceria com uma organização norte-americana.
Mas a intenção é ampliar a carteira de atendimentos. "A vantagem de uma design house é que nós conseguimos distribuir os custos entre vários clientes", afirma Higor. "Nosso maior desafio, contudo, é a cultura empresarial brasileira: aqui, as indústrias ainda têm resistência em adotar tecnologias de ponta", lamenta o gerente do CDT.
Para o engenheiro Wagner Araújo, as design houses do Brasil precisam investir em um mercado específico de chips, não tão sofisticado, mas não menos necessário, como o de identificação por RFID. "Eu acho que seria uma bobagem nós competirmos com projetistas que criam circuitos integrados para microprocessadores, por exemplo", opina. "Podemos, sim, capacitar o país, mas algumas coisas sempre vão ser importadas", diz.
Lei de Moore
A escala do desenvolvimento tecnológico foi prevista em 1965, por Gordon Moore, um dos fundadores da Intel. A chamada Lei de Moore diz que, a cada 18 meses, a capacidade dos chips dobra e o preço cai pela metade. A regra vale ainda hoje, embora especialistas anunciem que, em breve, a lógica do mercado será outra.
Fonte: Correio Braziliense

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